Imagine que determinada cultura agrícola ou
pecuária seja
um veículo que se desloca à determinada
velocidade num
período de tempo específico. Faz de conta que a
estrada
que ela utiliza são as áreas
agricultáveis de um
país-continente chamado Brasil. Agora vamos pensar numa
maneira
de verificar para quais direções este
“veículo” se desloca e quais as
distâncias ele
já percorreu nos últimos 25 anos. É
sobre esse
desafio espetacular que o pesquisador Fernando Luís
Garagorry
fez palestra no último dia 17, no auditório da
Embrapa
Algodão, em Campina Grande (PB).
Sob o título “Concentração e
Dinâmica
do Algodão Herbáceo de 1975 a 2003", a palestra
do
professor Garagorry foi parte das atividades que o pesquisador realizou
semana passada na Paraíba, para estruturar as atividades
finais
do projeto “Evolução da agricultura
brasileira em
um período recente”, concluído em
2007. Ele
está sendo assistido pelo pesquisador José
Wellington
Santos, que também faz parte da equipe de pesquisa. Os
resultados desse projeto servirão de base para outro em
andamento, chamado “Cenários territoriais para a
agricultura brasileira nos 5-10 anos”.
A pesquisa, inédita na América Latina, utiliza
ferramentas metodológicas e teóricas da
estatística descritiva, de análise multivariada e
de
séries temporais para medir os movimentos
agrícolas,
definindo medidores de velocidade, aceleração,
força e conceitos de distância, todos oriundos da
Física. “No caso do algodão
herbáceo,
percebe-se que a partir de 1995 a cultura iniciou um movimento de
subida em direção ao centro-oeste do
país, saindo
de São Paulo e Paraná. O deslocamento do centro
de
gravidade geodésico da produção, desde
1975, foi
de 563 quilômetros”, comenta Garagorry.
Ele explica que o trabalho visa criar conceitos mais operacionais para
a análise das dinâmicas de
produção no
agronegócio. A análise de séries
temporais de
variantes como produtividade, área colhida etc,mostram como
é complexa essa dinâmica. Analisando os dados do
algodão herbáceo entre 1975 e 2003, por exemplo,
nota-se
que a área colhida encolheu, mas a quantidade produzida
cresceu.
Em 75 a área colhida no país era de 1.546.831
hectares,
diminuindo para 712.556 hectares em 2003. Já o volume
produzido
cresceu de 1.330.020 toneladas em 75 para 2.199.268 em 2003.
Já
a região Centro-Oeste registrou em 1975 apenas 152.430
toneladas, subindo para 1.540.926 toneladas em 2003.
Agora na segunda fase da pesquisa, Garagorry e Wellington Santos
pretendem fazer caracterizações dos conglomerados
de
produção do algodão
herbáceo no Brasil.
“A micro-região de Barreiras, na Bahia, por
exemplo, entre
os anos de 2002 e 2006, saiu de 7% da produção
nacional
para 27%”, detalha Fernando Luís.
Além do algodão, a pesquisa analisa o
deslocamento
territorial de mais 48 itens da produção
agropecuária primária pesquisados pelas unidades
da
Embrapa em todo o país, dentre os quais 14 deles definidos
na
categoria dos agroenergéticos, como a
cana-de-açúcar, dendê, pequi, mamona,
soja,
girassol etc. “Estamos mais interessados nos aspectos das
territorialidades. Soja e bovinos, por exemplo, não crescem
o
tempo todo de forma generalizada. Algo que pode ser percebido
é
que a cana-de-açúcar vai deslocando junto com ela
atividades como a pecuária de corte e de leite. Mas
não
podemos correlacionar essa dinâmica com apenas uma
cultura”, diz Garagorry.
Ele explica que na Europa esse tipo de estudo está vinculado
à idéia de mudanças no uso da terra, e
que no
Brasil o IPEA realizou alguns estudos sobre o deslocamento da
produção de grãos para o Centro-Oeste,
na
perspectiva de mapear as chamadas fronteiras agrícolas.
“O
melão saiu da fronteira sul e se deslocou cerca de 1500
quilômetros até Mossoró. Petrolina hoje
produz 20%
da uva nacional. Todas essas mudanças têm como
base a
atuação do homem como criador de
espaços de
produção, provocando a
modificação da
qualidade dos solos. Aspectos como abertura de estradas e rodovias,
expansão da rede de eletricidade e outros estão
diretamente envolvidos nos movimentos e dinâmicas da
agricultura. Em 1921 registravam-se os primeiros movimentos
migratórios do Rio Grande do Sul para Mato Grosso.
Até
bem pouco tempo havia uma linha direta de ônibus saindo de
Santa
Rosa no Rio Grande do Sul para Barreiras na Bahia”, comenta o
pesquisador da Secretaria de Gestão Estratégica
da
Embrapa.