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Embrapa
intensifica apoio ao
cultivo do sisal
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04
de outubro de 2004 |
Para
Euclides da Cunha, "o sertanejo
é, antes de tudo, um forte". Se ele tivesse conhecido a
disposição de uma pequena cidade sertaneja da
Bahia, com
certeza teria dito que o sertanejo é, antes de tudo, um
valente.
Essa é a impressão que se guarda depois de
visitar o
município baiano recordista na
produção de sisal
(90 mil toneladas/ano), encravado em meio a outros 32
municípios
no semi-árido, que foi batizado de Valente por causa de um
boi
brabo famoso na região.
A paisagem é inóspita como em qualquer lugar nos
milhares
de quilômetros do semi-árido nordestino. Em
Valente ainda
não pega celular, mas o desenvolvimento local do
município e região proporcionado pelo cultivo da
planta
fibrosa é evidente, mesmo numa realidade local em que 67,%
dos
estabelecimentos agrícolas possuem até 10
hectares e
18,9% possuem áreas entre 10 e 100 hectares. Na
praça
central está em fase de inauguração o
prédio do Centro Cultural da APAEB
(Associação dos
Pequenos Produtores do Município de Valente), financiado com
recursos do BNDES, que investiu R$ 120 mil na obra.
O Centro Cultural é o mais recente exemplo do poder de
organização que essa
associação conseguiu
estimular junto à população e mais
especificamente
a seus quase 1.500 associados.
Fundada no início da década de 80, a APAEB gera
hoje mais
de 800 empregos diretos em Valente, movimentando milhões de
reais na economia local, em forma de salários e compra de
matéria-prima dos agricultores. Para chegar a esse
nível,
a entidade interveio diretamente na economia da região,
procurando agregar mais valor aos produtos dos pequenos agricultores.
Hoje, o preço do quilo do sisal pago ao produtor
é de R$
1,18 (tipo extra). "Ainda há atravessadores atuando na
região, mas o pequeno agricultor sabe que tem um
preço
garantido se quiser vender seu sisal à APAEB", diz Luiz Mota
Souza, vice-presidente da associação.
Caminhando pelas ruas de Valente, Luiz é mais conhecido do
que o
atual prefeito da cidade. "Se a eleição fosse
hoje, nosso
candidato já estaria eleito", comenta ele, que se diz avesso
a
cargos políticos, mas que tem como certa a
vitória de seu
companheiro de diretoria, Ismael Ferreira de Oliveira.
Parcerias
- O site da APAEB conta que a primeira atividade econômica
foi um
modesto posto de vendas. "Um espaço onde os associados
colocavam
à venda os produtos da agricultura familiar e onde ao mesmo
tempo eles podiam comprar outros produtos por preços mais
baixos, já que não se visava o lucro no
empreendimento".
A entidade uniu os produtores para vender em grupo o sisal, principal
produto agrícola da região. "Aos poucos, passamos
à batedeira de sisal e depois à
indústria de
tapetes e carpetes, e assim trouxemos o dinheiro que antes ficava na
mão de atravessadores e intermediários.
Gradativamente, a
APAEB foi estimulando a diversificação,
através de
outros projetos econômicos, como laticínio e
curtume, que
criam mercado para que os produtores invistam na
criação
de caprinos e ovinos, animais ideais para as
condições
econômicas dos produtores e para o clima da
região, pois
consomem menos água e alimento do que os bovinos", conta
Luiz.
Com uma forte influência de setores progressistas da Igreja
Católica, a APAEB viu sua semente germinar principalmente em
decorrência das parcerias que estabeleceu nesses quase 25
anos de
existência. Durante esse período a entidade
recebeu a
cooperação de entidades como Banco do Nordeste,
Cáritas Brasileira, Ceris (Rio de Janeiro),
Fundação Doen (Holanda), Pão para o
mundo
(Alemanha), Fade (Pernambuco), SOS PG (Bélgica), Vitae
(São Paulo), Fundação Heinrich Boll
(Alemanha), Il
Canalli (Itália), Lateinamerika Zentrum E.V (Alemanha), MLAL
(Itália), Universidade Estadual de Feira de Santana, BNDES,
Cese
(Salvador), Disop (Bélgica), Fundação
Kellogg
(Estados Unidos), Fundo Canadá (Canadá), Manos
Unidos
(Espanha), Misereor (Alemanha), Moc (Feira de Santana), Simfr
(Bélgica), Sudic (Bahia), Winrock Internacional (EUA),
CORDAID
(Holanda), Fundação Getúlio Vargas
(São
Paulo), Inter American Foudation (Estados Unidos), Kreditbank
(Bélgica), Sabiá, Cultura e Arte Popular (Rio de
Janeiro), Schwab Foudation (Suíça), Refaisa
(Salvador).
Outra parceria estratégica firmada nos últimos
anos
está sendo desenvolvida com a Empresa Brasileira de Pesquisa
Agropecuária (Embrapa), através da Embrapa
Algodão, com sede em Campina Grande (PB).
Técnicos e
pesquisadores da estatal vinculada ao Ministério da
Agricultura,
Pecuária e Abastecimento estão dando suporte a
pesquisas
agronômicas com a cultura do sisal aos produtores vinculados
à APAEB.
A ação da Embrapa, agora com o financiamento do
programa
Fome Zero, tem-se concentrado principalmente na
orientação do manejo correto da cultura e no
aproveitamento integral dos restos culturais para a
alimentação animal. Técnicos da
estatal
introduziram na região a peneira rotativa, para a
produção da mucilagem do sisal, utilizada na
composição de feno.
"Como se trata de uma região com escassez de
alimentação para a
manutenção de ovinos e
caprinos, a mucilagem do sisal está se mostrando uma
excelente
alternativa para os agricultores e pecuaristas", diz Isaias Alves,
técnico da Área de Negócios
Tecnológicos da
Embrapa Algodão.
No mês passado a estatal promoveu uma visita
técnica a
Valente para cerca de 40 pequenos produtores do município de
Várzea Nova (BA), para que conhecessem de perto o modelo de
desenvolvimento obtido com o sisal. "O que nos chamou
atenção foi a silagem, o aproveitamento da bucha,
uma
coisa que a gente, no nosso município, a gente nunca tinha
se
dado conta do prejuízo que a gente tinha passado. Fico
imaginando quantos animais no passado morreram... a gente com a
mucilagem lá, né, os animais morrendo, e a bucha
também se perdendo lá porque a gente
não tinha
conhecimento do que podia acontecer, A gente aproveitava simplesmente a
fibra do sisal", lastima Genival Vitório de Amorim,
presidente
do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Várzea Nova.
Genival e seus companheiros voltaram para casa impressionados com o que
viram em Valente. No período da manhã eles
visitaram a
propriedade do produtor José Elias, da Fazenda
Sítio do
Meio. Ali puderam testemunhar de que forma os restos de fibra podem ser
transformados em ração animal. Elias contou que
também usa os restos culturais como cobertura morta e falou
sobre um problema da cultura: "De 2003 prá cá,
morreu
muito sisal. Ele começa a amarelecer. Dá tipo uma
praga,
aí ele começa apodrecendo, a qualidade da folha
fica
amarela, ele começa apodrecer a cepa, aí morre
muito.
Aqui na minha roça mesmo eu acho que morreu uns qutro por
cento,
mais ou menos. E na região morreu muito, aqui
também no
município do Valente. Teve dono de sisal de ter 100 tarefas
de
sisal e hoje não tem cinco", relata José Elias.
Em seguida o grupo se dirigiu à Escola Família
Agrícola, mantida pela associação. "Na
escola
criamos animais, como caprinos, galinhas, coelhos e abelhas. Se planta,
se faz pesquisa. E toda quinzena o conhecimento adquirido chega na casa
dos alunos. É que usamos a pedagogia da
alternância, ou
seja, o aluno passa uma semana na escola e outra em casa, repassando o
que aprendeu. Isso tem feito com que muitas propriedades e
famílias progridam", explica Luiz Mota. Ainda na escola o
grupo
pode ver na prática o beneficiamento do sisal com a peneira
rotativa.
No turno da tarde, os visitantes conheceram a unidade de
produção de derivados do leite de cabra, outro
ponto
forte do agronegócio da APAEB, onde é produzido
queijo e
iogurte. Mas o que chamou mesmo a atenção do
grupo foi a
visita à fábrica de tapetes e carpetes de sisal
da APAEB.
Eles presenciaram todo o processo fabril com fibras do sisal, desde o
beneficiamento, passando pela coloração,
à
confecção de tapetes e carpetes. Funcionando
todos os
dias da semana, durante 24 horas, a fábrica gera 570
empregos
diretos. A maior parte da produção é
exportada
para os Estados Unidos e alguns países da Europa,
principalmente
Holanda.
Demandas
- Segundo Luiz Mota, a demanda atual da região sisaleira de
Valente seriam novos aproveitamentos da planta, já que
atualmente só se aproveita de cinco a seis por cento de
fibra
bruta. Segundo os pesquisadores da Embrapa Algodão, no
Brasil
só se consegue extrair 4% da fibra disponível nas
folhas
de sisal, uma produtividade muito abaixo de regiões mais
competitivas, como México, onde os produtores conseguem
preços 30% superiores aos alcançados aqui.
"Apenas com o
manejo correto do corte das folhas os produtores poderiam evitar perdas
de até 40% de produtividade", comenta Odilon Ribeiro,
especialista no assunto.
"No início da década de 90 começou a
surgir um
surto, que pra nós é estranho por não
conhecermos
a causa dessa doença", comenta o vice-presidente da APAEB. O
problema grave a que Mota se refere começa a preocupar
também os pesquisadores é uma doença
batizada de
"apodrecimento do caule", provocada pelo fungo Bothrioplodia. "O fungo
tem se espalhado principalmente por causa do uso de facas contaminadas
por uma planta doente e utilizada em seguida nas plantas sadias",
explica Odilon.
Pesquisa
- O pesquisador diz que o monocultivo do sisal não
é uma
atividade agrícola sustentável no
semi-árido, o
que exige que essa cultura seja sempre plantada em consórcio
com
outros cultivos, principalmente algodão, leucena,
feijão
macassar, milho, mamona, capim bufel, palma forrageira e sorgo.
No exterior, os produtos derivados do sisal têm mercado
garantido
em setores como a jardinagem, onde o apelo ecológico das
fibras
de agave, por serem biodegradáveis, ganha terreno a cada
dia, em
relação aos sintéticos. "Como maior
produtor
mundial, o Brasil pode ainda ampliar muito suas
exportações de produtos derivados do sisal, mas
falta uma
campanha para promover o sisal brasileiro lá fora", reclama
o
pesquisador.
A Embrapa Algodão iniciou projetos em parceria com a
Universidade Federal de Campina Grande visando a
utilização dos resíduos do
desfibramento do sisal
na obtenção de materiais para a
construção
civil, como telhas em substituição ao amianto. Na
região de Valente a Embrapa trabalha em parceria com a
Universidade Federal da Bahia e com o Sebrae para potencializar o uso
de derivados do sisal. Os pesquisadores da estatal vinculada ao
Ministério da Agricultura, Pecuária e
Abastecimento,
dizem que a atual produtividade do sisal, em torno de 700 quilos por
hectare, pode aumentar rapidamente para os 1.500 quilos por hectare,
com a adoção das
recomendações
técnicas já disponíveis.
O Brasil é o maior produtor mundial de sisal, com uma
produção anual de fibras de cerca de 110 mil
toneladas. A
Paraíba é o segundo produtor nacional, produzindo
6 mil
toneladas de fibra por ano. A fibra é industrializada e
convertida em corda, barbante, tapetes, sacos, bolsas,
chapéus,
vassouras, artesanato e também como componente de
compósitos automobilístico.
No ano passado o país exportou 51.354 toneladas de sisal e
seus
manufaturados, sendo que 51,6% deste volume foi consumido apenas pelos
Estados Unidos. Outros grandes comprados internacionais são
México e Portugal. A tonelada do sisal preparado chegou a
ser
vendida por até US$ 300,00 em 2002. Na mesma
época, o
preço mínimo do sisal bruto para o produtor foi
de R$
0,42 e de R$ 0,46 para o sisal preparado.
Redação: Dalmo
Oliveira - MTb/PB N.º 0598
Comunicação Empresarial - Embrapa
Algodão
Tel.: (83) 3315-4300 / 4378
E-mail: dalmo@cnpa.embrapa.br
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